segunda-feira, 18 de abril de 2011

Novo chip sequenciador de DNA chega ao Brasil

Novo chip sequenciador de DNA chega ao Brasil


Foi lançado hoje na América Latina um novo seqüenciador de DNA que usa uma tecnologia inédita de semicondutores para realizar em apenas duas horas o trabalho que antes levava até um dia.
Mais rápido e barato do que equipamentos semelhantes, ele é a aposta da Life Technologies para democratizar o acesso ao sequenciamento de material genético.
A empresa investiu mais de US$370 milhões de dólares na tecnologia por trás do Íon Torrent Personal Genome Machine (PGM). A máquina, lançada em dezembro nos Estados Unidos, vendeu no primeiro trimestre de 2011 60 unidades no mundo. Na América Latina já foram vendidas cinco unidades, antes mesmo do lançamento. Este é o primeiro equipamento de larga escala a ser comercializado por menos de US$100 mil.
O grande diferencial está no pequeno chip que permite que sinais químicos sejam diretamente convertidos em informação digital – basta introduzir a amostra e toda a parte experimental é feita nos semicondutores e seus microsensores. Em seguida, um software faz a análise dos resultados. “Isso possibilita que se troque a capacidade do equipamento trocando apenas o chip”, explica Gianluca Pettiti, CEO da empresa para a América Latina.
Cada novo seqüenciamento exige o uso de um novo chip- que custa entre 500 e mil dólares. “O chip 314, já lançado, analisa até 10 milhões de nucleotídeos; o 316, que sairá em menos de 4 meses, consegue analisar 100 milhões deles, e o 318, que queremos lançar em ainda este ano, terá capacidade de um bilhão de nucleotídeos”, diz o CEO.
Os nucleotídeos, ou bases nitrogenadas, são os elementos que compõem o DNA de todos os seres vivos. Para se ter uma ideia, o genoma humano tem 3,3 bilhões deles, enquanto uma bactéria pode ter em torno de 5 milhões.
Pedaços no semicondutor
O seqüenciador PGM é voltado para trabalhos com microorganismos, vírus ou apenas trechos de DNAs mais longos – como o de humanos. “Ele trabalha detectando a variação dos átomos de hidrogênio”, explica Fernando Amaral, bioquímico da Life Technologies. Por isso, o aparelho dispensa o uso de químicos fortes ou de lasers, como outros modelos convencionais.
O sequenciador no qual o chip é inserido.
A primeira etapa para seqüenciar qualquer material é a preparação: é preciso processá-lo e quebrar a longa sequencia em trechos mais curtos. Atualmente, ele processa de 100 a 150 bases por trecho- mas este número deve aumentar para 400 até o final do ano. No caso de muitos microorganismos ou vírus, é possível analisar até todos os trechos curtos que constituem seu código de uma só vez.
Em seguida, o material recebe banhos seguidos de bases nitrogenadas. “Possuímos quatro tipos bases, ou nucleotídeos, que formam nosso DNA: Adenina, Timina, Citosina e Guanina, cada uma delas representada por suas letras: A,T, C e G”, explica Amaral. A adenina se liga à Timina, e vice versa, e o mesmo acontece entre Citosina e Guanina. “Quando essa base se liga à base do trecho analisado, ocorre a liberação de hidrogênio, e é essa liberação que o chip detecta e armazena”, diz.
Esses banhos acontecem em ordem: um banho de A, um de T, um de C e um de G. Cada ciclo completo de quatro configura um “flow” – e são necessários 65 flows para terminar a análise. Isso ocorre porque as “Letras” do trecho a ser analisado reagem apenas na sequencia: a segunda só pode liberar hidrogênio depois que a primeira já o fez. “Por exemplo, vamos pensar na sequencia AGGTCA. O primeiro banho de Adenina não causa nenhum reação, pois a Adenina só se liga à Timina (T), que está apenas em 4º lugar na fila”, explica o bioquímico. “Já segundo banho, o de Timina, faz com que ocorra a liberação de hidrogênio na primeira letra – A. Qualquer outro A da fileira terá que esperar uma próxima vez, pois as coisas só acontecem em sequencia. O terceiro banho, de Citosina, vai fazer com que haja liberação de hidrogênio em duas bases – os dois G, pois eles estão um ao lado do outro. E assim por diante”.
Essa variação de hidrogênio permite ao software compreender onde está cada base e, assim, “ler” o código genético. O processo todo leva apenas duas horas – enquanto seqüenciadores tradicionais levam até 24 horas.
O PGM não é indicado para a análise de material genético desconhecido. Ele foi desenvolvido para que pesquisadores pudessem selecionar trechos que gostariam de analisar e comparar as descobertas ao DNA já seqüenciado de seres vivos. Hoje em dia, essa informação sobre as criaturas – inclusive os humanos- é bastante acessível. “Seqüenciar coisas novas exige outro tipo de equipamento, capaz de lidar com 300 bilhões de nucleotídeos”, explica Amaral.
Apenas comparar o material genético de um indivíduo com o que é considerado a “base” de sua espécie pode parecer algo “menor” do que o seqüenciamento completo de um organismo. No entanto, essa comparação é importantíssima. Na verdade, ela é que pode permitir, no futuro, o desenvolvimento da chamada Farmacogenética – medicamentos baseados na composição genética dos indivíduos.
Remédios e genes
Por que algumas bactérias são mais agressivas? Por que uma pessoa reage a um medicamento, enquanto o mesmo parece não surtir efeito em outra? Por que alguns pacientes têm tantos efeitos colaterais com determinadas quimioterapias?
A resposta para essas e outras perguntas está no DNA. Imagine um paciente com leucemia que não reage à medicação. Os pesquisadores podem pegar o DNA do paciente, retirar apenas o trecho que a literatura indica estar relacionado à doença e analisá-lo. “Essa medicina personalizada é pensada para agir na proteían que aquele gen codifica, e não no gene em si”, diz Flávio Amaral. Assim, no futuro, poderia haver diferentes variações de um mesmo remédio, para a mesma enfermidade, cada um voltado para um grupo de pessoas com determinadas características genéticas. Isso não só aumentaria a eficácia, como diminuiria os efeitos colaterais. “Mas isso depende não só do material seqüenciado, mas da capacidade de interpretar os dados obtidos e, claro, de uma série de outros fatores – como investimentos na área e legislação”, diz o bioquímico.
Vale lembrar, no entanto que, no Brasil, os seqüenciadores são exclusivamente para uso em pesquisas e não são destinados a fins terapêuticos. Isso significa que é permitido usá-los apenas para estudar humanos ou animais, e não para realizar diagnósticos. Em outras partes do mundo, outras legislações são mais flexíveis quanto ao seu uso.

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